Judicialização volta ao radar do setor com revisão da REN 482

O tema revisão da geração distribuída (GD) voltou à pauta. Com a publicação da NT 0030/2021 – SRD/ SGT/ SRM/ SRG/ SCG/ SMA/ ANEEL, de 30/03/2021, há uma real perspectiva de que o setor elétrico volte a conviver com decisões judiciais que contestem a adoção da alternativa mais restrita para a compensação de energia gerada por meio de sistemas próprios. Isso porque a falta de um período de transição pode afetar o que se chama de direito adquirido. Caso a diretoria da agência reguladora promulgue a alteração da norma, a tendência é que o judiciário volte a permear o noticiário em decorrência da busca por uma medida mais equilibrada na revisão da norma.

 

A publicação pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) atendeu pedido do Tribunal de Contas da União (TCU) no Acórdão 3063/2020 e apresentou a análise das contribuições ao processo de consulta pública para a revisão da REN n 482/2012 até dia 31 de março. A opção apresentada na NT datada de 30 de março aponta para a utilização da alternativa 5, o que levaria a um desconto de 62% sobre cada kWh injetado na rede.

 

Essa alternativa foi apontada na recomendação do próprio TCU para “evitar ao máximo os chamados subsídios cruzados” e, ainda, porque, dentre as “propostas naquele momento, essa era a única com potencial de neutralizar completamente os efeitos da política de subsídios e da diferenciação tarifária que constituem o problema em exame”, aponta a NT em referência às conclusões e recomendações do TCU.

 

O documento da Aneel indica que a avaliação do TCU aponta que a CP 25/2019 é regular e respeita princípios que atestam a sua boa fé na condução do processo de revisão das regras, considerando improcedentes as alegações apresentadas contra a medida. Além disso, destaca que, no Acórdão, o Tribunal classifica o sistema de compensação na forma atual como uma política de subsídio cruzado, o que, dentre outras medidas, exige a sua correção com efeitos futuros. Cita, ainda, que o Tribunal destacou em sua decisão o volume financeiro desses subsídios, “segundo números da Aneel, cerca de R$ 205 milhões, em 2018, e de R$ 315 milhões, em 2019, podendo chegar, em valores presentes, por volta de R$ 55 bilhões, no período compreendido entre 2020 e 2035”.

 

Além de determinar a revisão da REN 482, o TCU recomendou ao Ministério de Minas e Energia a formulação de um modelo de nova política pública, em substituição ao sistema de compensação atualmente previsto na Resolução Aneel 482/2012, a ser submetido à avaliação do Congresso Nacional, e que, enquanto não houver uma deliberação do Congresso,  a Aneel tem a competência para atuar sobre o tema.

 

Para um advogado ouvido sobre o tema, a revisão, se colocada em vigor, pode levar a uma nova onda de judicialização. Ele explica que a alternativa que consta da minuta de resolução normativa é que os consumidores já conectados ou com protocolo de acesso completo até a publicação da resolução terão até 2030 a compensação com todas as rubricas de energia na tarifa de energia e TUSD.

 

Para aqueles com protocolos de acesso após 1º de dezembro, somente a parcela de energia da TE, bem como para sistemas que registrarem aumento de potência. E, ainda, os consumidores não enquadrados na regra anterior que apresentarem pedido após a resolução ou parecer de acesso terão apenas a parcela de energia da TE compensada a partir de 2025.

 

Outra advogada, Marina Meyer, diretora jurídica da Associação Brasileira de Geração Distribuída, concorda e também cita o risco de nova onda de judicialização. Ela, que é consultora em energia na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) Nacional e diretora da comissão de GD na OAB-MG,  diz que a NT trouxe uma surpresa inesperada diante de toda a conversa que associações, como a ABGD, Absolar, AbraPCH, dentre outras, vinham tendo com a Aneel.

 

A advogada argumenta que a GD não traz esses impactos relacionados. Até porque quem possui sistemas de geração distribuída paga sim pela rede. No caso de sistemas de até 75 kW, o pagamento se dá por disponibilidade da rede de distribuição. Para os sistemas acima disso, há o pagamento do MUSD ou de demanda contratada. No primeiro, os valores variam por fase, podendo ser de R$ 100 a R$ 200; e, no segundo, é mais elevado. “Um sistema de 1 MW paga, sem considerar os impostos, R$ 25 mil por mês pelo Montante de Uso do Sistema de Distribuição”, argumenta.

 

Marina destaca que a ABGD tem um estudo técnico no qual chega à conclusão que a geração distribuída gera benefícios que chegam a R$ 154 bilhões em dez anos ao evitar a geração de energia térmica mais cara.

 

“Um sistema de 1 MW paga, sem considerar os impostos, R$ 25 mil por mês pelo Montante de Uso do Sistema de Distribuição”, Marina Meyer, da ABGD

 

“A alternativa cinco, como proposta na NT da Aneel, seria um desastre para o setor. Somos contrários a essa proposta, acreditamos que a melhor saída é a que está no chamado PL da GD, do deputado Lafayette Andrada”, relatou a diretora da ABGD. Inclusive, continuou ela, serão apresentadas três modificações no projeto que foram reveladas pelo parlamentar ainda nesta segunda-feira, 5 de abril, e o PL poderá ser avaliado em 8 de abril.

 

A primeira modificação que será apresentada, contou, vale para projetos acima de 500 kW de potência. Esses sistemas pagariam toda a TUSD-fio B e 40% da TUSD-fio A mais os encargos, sem período de transição, a partir da nova lei. Já os sistemas de microgeração, que vão até 75 kW, e os de mini GD, até 500 kW, pagariam integralmente a TUSD-fio B. Além disso, os sistemas já instalados ou com o parecer de acesso ou a solicitação de parecer de acesso que vierem em até 12 meses da publicação da nova lei teriam as regras atuais mantidas por 25 anos a partir da data de operação.

 

“Somos a favor de uma regra que traga equilíbrio na revisão da REN 482 da Aneel e, para nós, a alternativa que está no Congresso é a mais adequada para todo o sistema elétrico nacional”, comentou Marina. “A cobrança tem que ser sustentável, não dessa forma imposta”, finalizou.

 

Procurada, a Agência Nacional de Energia Elétrica não respondeu aos questionamentos da reportagem até a publicação desse texto para abordar os próximos passos desse processo.

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