O presidente da Abrace (Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres), Paulo Pedrosa, informou, em entrevista, que existe um diálogo entre as indústrias e o governo federal para tratar de um modelo estrutural de resposta à demanda para enfrentamento da crise energética.
Em meio a uma seca recorde no país, a ideia é que seja criado um mecanismo descomplicado e competitivo que permita às indústrias compensar o aumento das taxas de energia.
Entre as soluções em análise, estão o deslocamento de processos fabris para horários de consumo fora do pico e o uso de geradores privados de energia. Sobre isso, Pedrosa diz: “Mas, é claro, só vale a pena para a indústria se ela receber um sinal econômico do governo”. E completa: “Se o governo estiver disposto a pagar por uma usina termoelétrica de R$ 1.500/2.000/MWh [US$290/390(MWh], poderia perguntar quem está disposto a fornecer esta energia pelo menor custo”.
O modelo atual, no entanto, não caminha na direção simplificada. Algumas empresas foram solicitadas a assinar um contrato de prestação de serviços junto ao ONS (Operador Nacional do Sistema). Este processo exigiria alterações jurídicas internas e, por consequência, uma assembleia de acionistas.
O presidente da Abrace comentou: “No caso das multinacionais, isto é ainda mais complicado. Defendemos um modelo automático: a empresa aconselha que consumirá menos na semana seguinte e, uma vez cumprido tal compromisso, recebe crédito em sua conta”.
Há uma expectativa de que o cenário atual antecipe a adoção de diferentes soluções para auxiliar na redução do consumo de energia tanto nas indústrias quanto em setores de serviços e residencial.
De acordo com Marcos Matias, Country Manager da Schneider Electric no Brasil, existem alguns grupos de ações que podem ajudar na redução do consumo de energia em até 40%.
Uma delas é pertinente ao que se pode fazer internamente, como substituição de lâmpadas convencionais por modelos de LED, a substituição de frota veicular movida a eletricidade por carros com abastecimento a combustível fóssil, instalação de sistemas de ar-condicionado de precisão com manutenção preventiva dos equipamentos.
Outra alternativa está ligada a modelos de contratação de energia mais competitivos. As empresas podem migrar para o mercado livre e investir em consumo de energia renovável através de sistemas de geração distribuídos.
Por fim, a busca por soluções mais sustentáveis pode seguir pela cadeia de valor. Um dos exemplos é o programa adotado pelo Walmart. O programa Gigaton PPA, realizado em parceria com a Schneider, tem como objetivo a adoção de energia renovável pelos fornecedores norte-americanos por meio de acordos de compra de energia agregada, os chamados (PPA – power purchase agreements).
Em declaração ao BNamericas, Matias disse: “Muitas empresas no Brasil já estavam adotando a métrica ESG (environmental social and corporate governance) e agora, com a crise hídrica, estão acelerando medidas nessa direção”.
Para Jônatas Lima, representante da fornecedora de soluções energéticas Ativa Energia, existem também outras formas de reduzir o consumo. Alguns exemplos são o controle e automação de cargas, sistema de microgeração a gás natural (substituindo o diesel), sistemas de armazenamento de energia e o gerenciamento inteligente, para melhor avaliar e planejar o consumo de energia.
O representante da Ativa Energia declarou: “Já havíamos notado um aumento na demanda por nossos serviços a partir de meados de 2020 devido à pandemia, quando as pessoas começaram a olhar mais de perto para suas casas enquanto se protegiam do vírus. E isto foi intensificado ainda mais pelo medo do racionamento de energia”.
A empresa, que é subsidiária de investimentos e estruturação de projetos do grupo Prime Energy, tem entre seus clientes consumidores residenciais industriais e comércios, incluindo redes de supermercados e shopping centers.
“O risco de ficarmos sem energia nos leva a querer usá-la da melhor maneira possível e a ter algum nível de autonomia”, completa Lima.
Mesmo diante de uma elevação dos preços das matérias-primas para equipamentos de energia solar e eólica, o vice-presidente de risco e regulamentação da Focus Energia, Henrique Casotti, afirmou que houve uma alta na demanda de geração distribuída e de soluções de eficiência energética. Em entrevista, ele declarou: “Por trás de tudo isso, está uma maior aversão ao risco por parte do governo e do ONS, tendendo a antecipar cada vez mais o despacho térmico, resultando em preços à vista mais altos e tarifas reguladas”.
Ananias Gomes, presidente da Insole, provedora de soluções financeiras de energia, informou que a demanda por sistema de energia solar cresceu especialmente nas últimas semanas. Segundo Gomes, “a portabilidade da energia limpa torna-se uma alternativa muito interessante para o bolso do consumidor, porque a redução de custos está diretamente ligada a um valor efetivo atual e não futuro”.
Para o presidente da Insole, a empresa espera que seu volume de vendas e financiamento cresça ainda mais rápido.
A empresa Órigo Energia, especializada em geração de energia compartilhada, antecipa que haverá um salto em sua capacidade total instalada de energia solar fotovoltaica no estado de Minas Gerais. O valor deve subir de 56MW para 100MW até dezembro de 2021.
O modelo de negócios da Órigo se baseia na geração de energia em fazendas solares para incorporação na rede de distribuição, abrangendo pequenas e médias empresas ou consumidores residenciais, proporcionando descontos em suas contas de energia de até 10% para empresas e 15% para residências. Entenda a diferença entre baixa e alta tensão.
A Órigo possui um sistema de adesão 100% digital, por meio do site da empresa. Em entrevista, seu porta-voz disse: “Os mais de 15 mil clientes atuais, que devem chegar a 20 mil no curto prazo, fazem uma assinatura mensal e compram créditos de energia solar”.
As distribuidoras deverão investir esforços na informação aos consumidores. O foco é alertar sobre o consumo consciente de energia em meio à crise hídrica enfrentada no país. O chefe da Abradee (Associação Nacional de Concessionárias) informou que uma campanha pública para incentivar o consumo de energia fora do horário de pico deverá ser lançada em agosto. “Haverá um impacto nas receitas dos distribuidores, mas o mais importante é ajudar a minimizar os efeitos da crise”, disse ele.